O que é e o que não é Psicanálise?

A Psicanálise não é terapia ou psicoterapia, é um método investigativo. Busca compreender os sentimentos, ações e reações, assim como a explicação e interpretação daquele conteúdo de traz sofrimento. Sendo assim, não trabalha com os sintomas, mas com sua causa. Não entra em contexto de cura, mas do alívio desses sintomas, a partir do conhecimento da causa. Procura tornar consciente o que está inconsciente, para que esse conteúdo seja ressignificado. Psicanálise não é orientação. Não trabalha com hipnose, mas com a livre associação de ideias. Sua proposta está voltada para o autoconhecimento.

quarta-feira, 5 de junho de 2024

A resistência no setting analítico



Quando falamos sobre a resistência do analisando, pensamos que por ter procurado auxílio deveria estar aberto às condições que a análise exige. Mas será que essa resistência é consciente, ou é inconsciente? Caso seja consciente, como podemos "quebrá-la"? Caso seja inconsciente, como acessar esses conteúdos que impedem o analisando de se abrir, de acessar o conteúdo recalcado que está lá guardado, esperando um momento oportuno ou não para vir à tona.

Podemos dizer que a resistência é tudo aquilo que atrapalha a continuidade do trabalho terapêutico e que dificulta o acesso ao inconsciente, prejudicando uma evolução das questões apresentadas.

É importante compreender que o objetivo não é o analisando aceitar uma interpretação oferecida pelo analista, sem ter entendimento e aceitação da lógica dessa interpretação na teoria psicanalítica.

A proposta é buscar uma compreensão dos mecanismos mentais que alimentam essa resistência.

Por trás de tal defesa podemos supor a existência de determinados desejos inconscientes reprimidos.

É justamente essa tomada de consciência de tais desejos o objetivo do tratamento psicanalítico; pois de acordo com essa teoria, eles têm uma íntima relação com a origem dos problemas do paciente.

Por que ocorre a resistência?

São várias as razões que levam o analisando a apresentar resistência, entre elas pode ser o medo inconsciente de acessar uma lembrança muito dolorosa e sofrida, ainda que seja essa a proposta da análise, ou seja, para a compreensão daqueles sintomas apresentados. Pode também estar relacionado a um conteúdo de cunho sexual que cause vergonha, ou a um desejo voltado para perversão e até questões mais complexas, como machucar alguém de fato.

Freud observou que o indivíduo pode ter a capacidade e a vontade consciente de deixar de renunciar ao seu sintoma e ainda assim não conseguir abandoná-lo devido a determinados fatores inconscientes. São justamente esses fatores que Freud denominou de resistências.

Das concepções de resistência Freud nos apresenta duas particularmente interessantes: a primeira é a "resistência da doença", a resistência de uma doença ao tratamento, à cura.

Outro conceito Freud traz da palavra "resistência" em seus escritos iniciais é no sentido de uma "resistência do organismo'", ou do paciente; assim poderíamos dizer – uma resistência do organismo à doença.

Partindo da concepção propriamente psicanalítica da resistência, simplificando e considerando os fenômenos neurais, a resistência ao tratamento psicanalítico se expressa em fenômenos como: a censura, ou seja, o impedimento que certos conteúdos acedam à consciência, o que toma a forma de uma resistência à lembrança de certos eventos; a resistência à interpretação, seja dos sonhos ou de quaisquer outros fenômenos em uma análise; e a simples resistência a associar livremente.
Estes três fenômenos têm em comum a resistência a estabelecer associações com os conteúdos recalcados.

E como superar essa resistência?

Freud explica que é importante dar ao paciente tempo para conhecer melhor a resistência com a qual acabou de se familiarizar, para elaborá-la, superá-la seguindo com o trabalho analítico.

Só quando a resistência está em seu auge é que pode o analista, trabalhando em comum com o paciente, descobrir os impulsos recalcados que estão alimentando a resistência; e é este tipo de experiência que convence o paciente da existência e do poder de tais impulsos.

Assim entendemos que a análise não é da resistência, mas do conteúdo identificado. E essa elaboração é a parte do analisando, enquanto ao psicanalista cabe a interpretação do revelado pelo paciente. Com isso, podemos conceber a resistência tanto como obstáculo quanto como possibilidade para continuidade da análise.
Nesse contexto a resistência pode adquirir o lado negativo ou positivo.
Negativo quando não é bem elaborada e seu conteúdo permanece incógnito criando afastamento na relação analista e analisando, até o momento que o analisando entende que não quer mais fazer a análise, pois é algo sofrido e desconfortável.
Positivo quando a superação da resistência traz à tona as respostas que serão de grande ajuda para a identificação do conteúdo recalcado e possibilitará o alcance de resultados positivos.

Como forma de ampliar o conhecimento, as resistências podem ser dividas em:

Provenientes do ego

Resistência de repressão: repressão que o ego "produz" frente a qualquer percepção que venha causar sofrimento.

Resistência de transferência: resistência do paciente contra a emergência de transferência em relação ao analista.

Resistência de ganho secundário: são aquelas egossintônicas, onde o paciente "pretende" usar da própria doença em seu benefício.

Provenientes do id

Resistências contra a mudança: relacionadas à "compulsão à repetição", onde o paciente inconscientemente resiste a impulsos instintivos que possam promover mudanças em sua forma de "viver", ou sobreviver, e se expressar.


Provenientes do superego

Resistências do superego: claramente relacionadas a sentimento de culpa e necessidade de punição.

Assim concluímos que existem diferentes tipos de resistência e como colocado no início do texto, algumas são conscientes, no entanto, de forma gera,l o analisando apresenta uma resistência inconsciente que deverá ser elaborada para compreensão desse conteúdo e para compreensão da melhor forma de auxílio a ser prestado.


Referências 
 
Freud, S. (1888/1987). Histeria. In S. Freud, Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (Vol. 1, pp. 63-83) (2a ed.). Rio de Janeiro: Imago.

Freud, S. (1889/1987). Resenha de Hipnotismo, de August Forel. In S. Freud, Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (Vol. 1, pp. 109-121) (2a ed.). Rio de Janeiro: Imago.

 

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