O que é e o que não é Psicanálise?

A Psicanálise não é terapia ou psicoterapia, é um método investigativo. Busca compreender os sentimentos, ações e reações, assim como a explicação e interpretação daquele conteúdo de traz sofrimento. Sendo assim, não trabalha com os sintomas, mas com sua causa. Não entra em contexto de cura, mas do alívio desses sintomas, a partir do conhecimento da causa. Procura tornar consciente o que está inconsciente, para que esse conteúdo seja ressignificado. Psicanálise não é orientação. Não trabalha com hipnose, mas com a livre associação de ideias. Sua proposta está voltada para o autoconhecimento.

segunda-feira, 3 de junho de 2024

A histeria na atualidade



Atualmente, quando ouvimos falar em histeria, pensamos ser um diagnóstico ultrapassado e relacionamos imediatamente a Freud; mas, em um contexto que parece muito distante dos dias de hoje.

Hoje, o termo é utilizado de forma pejorativa, quando uma mulher se coloca de forma mais incisiva, o que faz com que as pessoas não compreendam seu real significado.
No entanto, a histeria ainda é um diagnóstico e não deixou de existir, apenas foi substituído por outras designações, de forma a criar uma divisão que os médicos julgaram ser mais eficaz na identificação de certos males, ou melhor, transtornos.
Para melhor compreensão sobre o tema farei um breve retrocesso.
A palavra "histeria", atribuída a Hipócrates, não foi, de fato, utilizada por ele. A atual designação da histeria foi introduzida na literatura por Littré, em 1839, ao transpor para o francês as obras de Hipócrates.
Para Platão, em O Timeu, na mulher, o que se chama de matriz ou útero seria como um ser vivo, possuído do desejo de fazer crianças. Dessa forma, se durante muito tempo a matriz permanecer estéril, irá se irritar perigosamente, agitando todos os sentidos pelo corpo, obstruindo as passagens de ar e impedindo a inspiração, criando para o corpo as piores angústias, ocasionando outras doenças.
Foi apenas na Renascença que a histeria retornou ao campo da medicina, voltando seu olhar para a questão somática, relacionando a crise histérica ao orgasmo.
Em 1862, com as pesquisas de Charcot, a histeria passou a ser considerada uma afecção nervosa. Através da hipnose demonstrou que as paralisias eram uma representação do psiquismo dos pacientes.
A partir daí sabemos dos estudos de Freud e Breuer que acabaram a culminar na teoria das neuroses, com outros desdobramentos. Porém, é possível compreender, a partir desse breve resumo histórico, que a histeria deixou de ser vista como uma condição feminina, passando a ser diagnosticada em homens e crianças, inclusive.
No início, esse transtorno era visto de forma mais abrangente, incluindo neuroses, psicoses, catatonia, epilepsia, inclusive quadros degenerativos como demências e doença de Parkinson.
Atualmente essa abrangência cedeu espaço à inclusão de sintomas histéricos nos critérios diagnósticos de várias doenças, como os transtornos de forma geral.
Em 1993, com a décima edição da Classificação Internacional das Doenças (CID-10) e, em 1994, com a quarta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-IV), ficou estabelecido o fim da categoria histeria, com sua redesignação sob novas nomenclaturas diagnósticas.
Em 1994, foi publicado o DSM-IV, abolindo o termo neurose e dividindo a histeria nos chamados transtornos somatoformes, que abrangem transtornos conversivos, somatização e somatização sem outra especificação, hipocondríaco, dismórfico corporal, doloroso e somatoforme indiferenciado.
O DSM-V foi lançado em 2013 e também trouxe alterações significativas. Os transtornos somatoformes foram denominados "sintomas somáticos e transtornos relacionados".
Os critérios são agora mais diretivos e privilegiam o modo como o paciente lida com o sintoma, possibilitando incluir casos de ordem orgânica que sofrem interferência de questões psíquicas, tais como os quadros psicossomáticos.
Aparentemente, ganhou-se um maior rigor descritivo, pois agora esses sintomas estão devidamente enumerados e catalogados. Possivelmente, essa alteração, ao favorecer uma diferenciação mais efetiva entre as patologias psiquiátricas e orgânicas, pode ter suscitado um melhor manejo clínico dos doentes.
Com todas essas mudanças, uma questão é incontestável: a histeria ainda é atual e trouxe a luz aos transtornos que conhecemos atualmente.
Diferentemente da psiquiatria, a histeria não apenas foi extremamente valorizada nos primórdios da psicanálise, como ainda hoje representa para ela um tema de grande significado, recebendo a atenção de importantes estudiosos contemporâneos.
De uma coisa temos certeza e nada mudará isso!
A histeria, tanto em Freud como em Lacan, fez a teoria psicanalítica avançar. As histéricas analisadas por Freud no final do século XIX e início do século XX trouxeram grande contribuição para a compreensão de que o sintoma no corpo não se apresenta desarticulado da condição psíquica.
O sintoma, como mostrou Freud, apresenta um sentido inconsciente, e a histeria é uma forma de lidar com o desejo que se manifesta estruturalmente como desejo insatisfeito, como bem explicou Lacan.
O tratamento psicanalítico diz respeito a atenção ao sintoma no cerne de sua etiologia. Não há como desconsiderar o funcionamento psíquico do sintoma físico, é preciso ir a fundo na causa do problema.
A conversão somática, que faz parte do quadro da histeria, abriu espaço para muitas discussões e trouxe respostas para muitas questões médicas, antes sem solução.
A grande contribuição dos estudos com a histeria foi o olhar integral dispensado aos pacientes atualmente.
O termo holístico vem sendo muito empregado em medicina, pois considera as questões psíquicas envolvidas. Assim como oferece uma diversidade de tratamentos.
Depois de tanto tempo, vemos uma luz no fim do túnel, no que diz respeito ao tratamento visando eliminar o sofrimento dos pacientes, como dizia Freud, onde compreendendo as bases psíquicas podemos chegar a compreensão dos fenômenos físicos e propor um tratamento com maior eficácia.
Não importa o que digam, a histeria ainda é atual, de forma discreta está presente e cada transtorno e em cada sintoma não diagnosticado pelos médicos.

Referências

Freud, S. (1974). Estudos sobre a histeria (Edição Standard Brasileira da Obras Completas e de Sigmund Freud, Vol. 2). Rio de Janeiro: Imago.
Ferreira, A. B. H. (1988) Novo dicionário básico da Língua Portuguesa Folha/Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira.
Roudinesco, E.,

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